CREDIBILIDADE EM PAUTA

O desafio da credibilidade do jornalismo na web

Texto obrigatório para entender nosso questionamento.

Posted by gruponewton em abril 29, 2009

Jornalismo. De onde viemos? Para onde estamos indo?

Todos já sabemos que a tecnologia da informação está mudando drasticamente nosso perfil de relacionamento com a notícia. Mas quais são as novas fronteiras que estamos desbravando? Aqui mais um texto muito interessante que ajuda entender essa revolução. Publicado no Observatório da Imprensa.  Vale a leitura!

  

JORNALISMO & INTERNET
Dominic Gates

“Esqueça a morte dos jornais, eles vão sobreviver na era digital”, copyright O Estado de S. Paulo / Online Journalism Review, 5/05/02

 

“Em janeiro, a New York Times Company gastou US$ 75 milhões por uma participação de 15% no time de beisebol Boston Red Sox. A compra tinha muito pouco a ver com esporte.

Curiosamente, este foi o último exemplo de como o desafio de um futuro digital em banda larga está moldando a estratégia de negócios das empresas jornalísticas. ‘A companhia não tem interesse especial em ser dona de um time de beisebol’, diz Martin Baron, editor do The Boston Globe, outra propriedade da Times. ‘O que ela tem é um interesse em envolver-se com televisão.’

A Times buscava uma participação no canal a cabo New England Sports Network, que veio com o time. Mesmo assim, ver a venerável Times indo para a televisão a cabo parece só um pouquinho menos estranho do que comprar um time. E o que o casamento de dois velhos reacionários como televisão e jornal tem a ver com o futuro da mídia digital?

Na verdade, há uma explicação na mídia digital. A explicação para a misteriosa aposta da Times em TV a cabo pode ser resumida em uma palavra:

convergência. De olho nos desenvolvimentos tecnológicos, o setor de jornais está preparando-se para mudanças e, ainda que parte da retórica não seja inteiramente convincente, a convergência com emissoras e com mídia on-line é o formato das coisas que vêm pela frente para os jornais.

Apesar do pessimismo devido à atual queda na publicidade e à morte certa dos jornais, prevista por tecno-futuristas fanáticos, os principais líderes da indústria entrevistados recentemente pela OJR (Online Journalism Review) foram otimistas em relação ao futuro.

Enfrentando os desafios de um mercado de mídia fragmentado, eles não conseguem saber exatamente como o futuro vai surgir. Mas eles estão se preparando para o que quer que venha, agindo para adquirir participações em outras mídias, e mobilizando suas grandes redes de repórteres para produzir conteúdo para impressos, TV, Internet e outras mídias. Seria profundamente preocupante se não houvesse mudança no ar. Os jornais enfrentam claros desafios. As antigas ‘mídias de massa’ estão perdendo terreno em um mercado fragmentado pela multiplicação de canais a cabo e sites da web. Enquanto isso, os orçamentos são espremidos pela recessão do setor e pela pressão para fazer lucros de Wall Street; os jornais estão perdendo receita vital de anúncios classificados para operações on-line como Monster.com e CarPoint; e a lenta diminuição de circulação, que dura décadas, ameaça bloquear as artérias, a menos que os jornais possam de alguma forma agarrar a próxima geração de leitores.

Além disso, há um grande desconhecimento a longo prazo das mudanças provocadas pela tecnologia: parece simplesmente inevitável que algum dia a entrega digital de informação aprofundada e personalizada — incluindo texto, áudio e vídeo — em dispositivos eletrônicos suplante a entrega de cargas físicas porta a porta. Se os jornais querem sobreviver, é preciso haver mudança.

‘Se formos nos definir segundo nossa história, então merecemos sair do negócio’, diz Arthur Sulzberger Jr., presidente do conselho da The New York Times Company e publisher de seu principal jornal. Sulzberger, o mais recente diretor da brilhante história de sua companhia, está guiando-a agora para um futuro de ‘plataformas’ em diversas mídias.

‘Jornais não podem ser definidos como algo feito em papel. Devem ser definidos pelo conteúdo – notícias’, disse Sulzberger. ‘Todos temos de nos tornar independentes quanto ao método de distribuição. Temos de ser tão fortes na Internet, na TV e em rádio quanto somos em papel impresso.’

Os usuários de hoje acessam rotineiramente canais de TV a cabo especializados e sites na web para acesso constante a notícias e informação.

No futuro em banda larga, o acesso ao mundo on-line virá não só dos computadores mas também através de dispositivos sem fio e aparelhos de TV.

Ao mesmo tempo, o conteúdo on-line vai deixar de ser texto para tornar-se áudio e vídeo sob demanda. Quando isso acontecer, essas duas mídias — televisão e Internet — vão convergir.

‘Pôr em prática nossa visão de longo prazo também requer que nos tornemos mais familiarizados com televisão’, afirmou Sulzberger. ‘Em algum ponto no futuro não muito distante, alcançar massa crítica na Internet vai depender, em grande parte, de nossa habilidade em reunir a palavra impressa com a imagem em movimento.’ Daí o motivo do lance Red Sox da companhia Times: não é quanto a beiseibol; não é nem quanto a televisão ou Internet como as conhecemos; trata-se da futura Internet banda larga rica em vídeo.

Em abril, dois meses depois do negócio com o Red Sox, a Times pagou outros US$ 100 milhões por metade do canal de cabo Discovery Civilization.

Ao mesmo tempo, não esquece o desenvolvimento on-line: seus bem-sucedidos sites de jornais, inclusive o NYTimes.com e Boston.com, agora dão lucro, e a divisão New York Times Digital também está próxima disso. Em abril, a companhia fez um acordo para fornecer conteúdo noticioso para ‘bloggers’ (que publicam uma espécie de diário on-line, com informações e notícias) que usam o software de gerenciamento de conteúdo Radio Userland. Os ‘bloggers’ — que freqüentemente se proclamam como a nova onda de jornalismo descentralizado — poderão colocar noticiário do New York Times em seus sites. O Times parece saber como conquistar potenciais ameaçados.

Sulzberger não vê razão para intimidar-se com a Internet. Lembrado dos alertas do executivo da Microsoft Dick Brass — cujo discurso-padrão afirma que os livros eletrônicos vão substituir as revistas e jornais e prevê que a última edição em papel do New York Times sairá em 2018 — Sulzberger responde com um frustrado ‘Quem liga?’

‘Não me importa quando vamos imprimir nossa última edição’, diz Sulzberger.

‘Vamos continuar como a principal fonte de notícias e informação neste país e talvez no mundo.’ Depois, em um tipo de desafio à la Churchill, acrescenta: ‘Faremos isso na web. Faremos na televisão. Faremos em papel impresso.’

É uma história reconfortante para os jornais: enquanto as plataformas de mídia mudam, o negócio sobrevive intacto e a audiência, em vez de diminuir, cresce para proporções internacionais potencialmente vastas. A curto prazo, a televisão e a mídia on-line podem trazer novas receitas de publicidade vendida em pacotes de diversas mídias. Já que noticiário em texto pode ser colocado em reportagens de televisão e os jornalistas parecem especialistas apresentáveis, existe até sinergia — aquela grande explicação de negócios para qualquer fusão.

Também é uma visão lisonjeira para os jornalistas de impressos. A essência de seu trabalho reside nas palavras, não no papel. O meio é só uma garrafa e eles fornecem o vinho. O problema é que não é uma visão prática de forma alguma.

Certo, muitos jornais e jornalistas de impressos mudaram-se com sucesso dos impressos para a web. Isso porque a Internet ainda é dominada pelo texto.

Mas em um futuro dominado por vídeo, o jornais não vão se traduzir tão facilmente.

Baron, editor do Boston Globe, é um dos principais líderes de Sulzberger no lado editorial. Ele aceita a diversificação pedida pelo lado empresarial.

Mas em termos de funcionamento prático, ele vê limites para a colaboração entre mídias tão diferentes como televisão e impressos.

‘É difícil para mim enxergar algumas das pessoas em minha redação escrevendo programação de televisão’, diz Baron. ‘Quando começamos a discutir o que fazer com a New England Sports Network, ficou bastante claro para mim que não saberíamos por onde começar. Não temos treinamento nisso. Não sabemos nada sobre isso.’

As duas mídias, em outras palavras, ainda são como óleo e água. O ‘jornalista de mochila’ — um mestre da multimídia que pode fazer tudo e que rotineiramente leva um computador portátil e uma câmera de vídeo juntamente com o gravador e o bloco de notas — pode ser assunto de escolas de jornalismo de vanguarda, mas não deve se tornar a norma. Em vez de super-repórteres de multimídia, a The New York Times Company terá principalmente pessoal separado para televisão e impresso.

A convergência será bem mais difícil do que a retórica nos quer fazer crer.

Ainda assim, algumas companhias já começaram. Toda manhã, de um estúdio de TV na sua sede na Virgínia, a Gannet está enviando noticiário do dia em vídeo com as principais matérias do USA Today para 21 estações de TV que detém em 15 Estados. A Tribune Interactive está fornecendo noticiário para assinantes de dispositivos sem fio do serviço AT&T. E no Tampa News Center na Flórida, repórteres e produtores do jornal Tampa Tribune, WFLA-TV News Channel 8 e TBO.com (Tampa Bay Online) — todos de propriedade da Media HGeneral — colaboram no mesmo prédio.

‘Creio que é inevitável que a pressão econômica da fragmentação vai nos levar a produzir jornais, noticiário de TV, de rádio e interativo a partir de uma mesma redação’, diz Jack Fuller, presidente da Tribune Publishing, em janeiro, numa palestra de um congresso do Poynter Institute.

Fuller, autor de Valores Jornalísticos: Idéias para uma Era da Informação, é um homem de notícias até a raiz dos cabelos. Ex-editor do Chicago Tribune, ganhador do Prêmio Pulitzer e defensor ferrenho da independência jornalística, ele agora dirige o setor de jornais de uma das mais poderosas companhias de mídia dos EUA. A Tribune é a terceira maior rede de jornais do país, mas diferentemente da Gannet e Knight-Ridder, sua presença está concentrada nos maiores mercados metropolitanos. Além do Chicago Tibune, a Tribune publica o L. A. Times e o Newsday de Nova York. Uma vez que também era dona do time Chicago Cubs por mais de 20 anos, pode-se dizer que a Tribune está bem à frente quando se trata de convergência. De fato, ela tem uma longa história de investimentos em emissoras, com propriedade de 24 estações de TV em mercados importantes e acaba de comprar mais uma. Isso aponta para uma das prováveis conseqüências da convergência: mais consolidação de propriedade de mídia quando os gigantes entre as companhias de mídia estenderem seu alcance.

Em julho, Fuller testemunhou ante a Comissão Federal de Comunicações americana, pedindo que ela derrubasse a proibição de propriedade cruzada quanto a deter jornais e estações de televisão no mesmo mercado. Devido a uma propriedade herdada, a Tribune já tem ambos nos mercados de Nova York, Los Angeles e Chicago. Fuller diz que a Tribune vê muito mais oportunidades se a proibição de propriedade no mesmo mercado for suspensa, como é amplamente esperado que aconteça. Se for assim, grandes companhias de mídia sairão comprando e vão provavelmente trocar ativos de modo que acabem tendo jornais e estações de TV no mesmo mercado.

O lado positivo para a Tribune, disse Fuller, seria a capacidade de diluir os custos de suas operações de notícias entre diversos sistemas de distribuição. Seu pessoal de jornal vai colher o benefício da receita e ele não vê problemas, contanto que eles tenham apoio firme da Tribune para proteger sua independência editorial. O efeito líquido sobre seus jornais?

Ajudaria a preservar a base econômica de suas operações noticiosas de nível internacional, diz Fuller.

Maior concentração de poder de mídia em poucas mãos é uma conseqüência inevitável da ‘fragmentação radical’ do mercado de mídia, afirma ele. ‘Como você financia grande jornalismo no século 21?’, pergunta. ‘Manter seu empreendimento pequeno e único provavelmente não é a resposta certa.’

Um olhar sobre o panorama dos jornais mostra operações regionais menores, também desafiadas pela mesma fragmentação de mídia, trazendo respostas diferentes.

O publisher do Seattle Times, Frank Blethen, prevê uma grande mudança a curto prazo: áreas metropolitanas com dois jornais devem perder um deles.

Blethen deve saber. O principal jornal de sua companhia familiar briga toda manhã com o Seattle Post-Intelligencer, da Hearst. Embora ambos compartilhem recursos em um acordo operacional, para Blethen o acordo vive com suporte artificial. Ele é contratualmente obrigado a aceitar isso por enquanto, mas não vê uma continuação. Blethen acredita que com exceção dos seis maiores mercados americanos, comunidades médias como Seattle acabarão tendo um só jornal.

Blethen não vai derramar lágrimas se Seattle tornar-se uma cidade com um só jornal; ele espera que seu jornal seja o que vai sobreviver e que a cidade mantenha bastante diversidade graças a seus jornais alternativos e de bairro.

Ironicamente, nacionalmente Blethen é um oponente aberto da consolidação de jornais. Ele rotula a concentração de propriedade e o desgaste dos jornais controlados por famílias como nada menos que uma ‘crise da democracia americana’. Em contraste com Fuller, ele está fazendo lobby pesado contra a mudança na restrição à propriedade cruzada nos EUA. Ele ataca as grandes redes de capital aberto por cederem às pressões de Wall Street e ‘transformarem-se companhias controladas por capital financeiro, que não têm valores jornalísticos ou de serviço à comunidade’.

Entrevistado imediatamente após saber que seu jornal havia perdido contenciosamente no Prêmio Pulitzer em reportagem investigativa, Blethen ainda assim estava à vontade e determinado quanto ao futuro. O Seattle Times sofreu mais que a maioria na recessão de 2001 por causa de uma danosa greve de sete semanas em 2000, que levou à saída de talentos da redação e impôs dívidas à companhia justo antes de a economia despencar.

Mas agora o jornal parece ter se recuperado e voltou a contratar. Como operadores nacionais, Blethen está movendo seu jornal em direção a ‘formatos múltiplos em termos de formato e distribuição’. Ainda assim ele sustenta que jornais locais independentes vão continuar a fazer sentido economicamente em seu atual modelo de negócios por muitos anos ainda.

‘Jornais, particularmente de capital fechado e não impulsionados por algum modelo financeiro de curto prazo, fazem um dinheiro danado de bom’, diz Blethen, animado, apesar dos horrores do ano passado.

Do outro lado do Lago Washington, um competidor de Blethen está investindo pesadamente no velho modelo de negócios. Peter Horvitz, presidente da Horvitz Newspapers, uma rede de pequenos jornais comunitários que atendem principalmente os subúrbios de Seattle, está atualmente despejando US$ 20 milhões em uma nova gráfica.

Os jornais menores vão prosperar, diz Horvitz, simplesmente porque ‘eles são a única fonte de notícias e informação que é local’. É precisamente porque toda a captação de notícias é local, tanto em pequenos mercados rurais quanto em grandes mercados urbanos, que os jornais permanecem como os geradores primários de notícias.

‘Só os jornais são economicamente organizados para captar grandes quantidades de informação’, assegura John Morton, da Morton Researching, uma consultoria de mídia de Silver Spring. ‘A televisão não faz isso. Nenhuma das operações de Internet faz isso.’

Bill Gates, aponta ele, tentou e falhou ao buscar fazer isso com seu guia urbano Sidewalk. ‘Os jornais têm uma base de dados imensa e são especialistas em manipulá-la e destilá-la até um tamanho aproveitável,’ diz Morton.

Qualquer jornalista sabe como outras mídias aproveitam essa cobertura. Em Seattle, você não consegue ouvir a locutora do noticiário da manhã na estação local NPR ‘Notícias e Informação’ realmente virar as páginas de jornal enquanto lê o noticiário local, mas o boletim é normalmente escolhido sem problemas, nem créditos, nas primeiras páginas dos dois jornais metropolitanos.

‘Há uma velha piada’, diz Morton, ‘se você quer ver as estações de TV em pânico, vá a uma cidade onde os jornais estão em greve.’

Em uma era de tecnologia, o principal bem da indústria de jornais — grandes redes de jornalistas que captam informação — é freqüentemente esquecido. É um bem que outras mídias não conseguem alcançar e que os jornais podem aproveitar quando avançam nas tecnologias digitais.

Em 2001, o pior ano de publicidade talvez desde a Grande Depressão, as operações de jornais das companhias de capital aberto ainda conseguiram obter uma margem de lucro média de 18%, de acordo com Morton. Todas as indicações são de que as companhias de jornais vão manter negócios prósperos e lucrativos e que as notícias vão ser entregues em papel por um tempo bastante longo. Elas têm esse tempo de fôlego para experimentar a nova tecnologia, novos mercados, novos modelos de negócios e novas mídias.”

http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos/asp08052002994.htm

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